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quarta-feira, 4 de abril de 2007

O papel da Doula

O parto há alguns anos atrás era considerado como um acontecimento de mulheres e para mulheres. As mulheres tinham os seus filhos em casa, rodeadas das mães e/ou irmãs e outras mulheres que lhes prestavam o apoio emocional e físico e a parteira. Assim era no tempo de minha avó. Ela teve 10 filhos e todos foram amamentados até aos 2-3 anos. Nunca teve dúvidas se conseguiria ou não parir, se conseguiria ou não amamentar os seus filhos. Tinha um profundo conhecimento da sua sabedoria interior, conhecia a capacidade inata do seu corpo para a tarefa da maternidade. Entrou em trabalho de parto naturalmente, os trabalhos de parto e partos decorreram sempre sem pressas, sem adição de quaisquer agentes externos no seu corpo, tudo decorreu a seu tempo e ao sabor da vontade do corpo dela e do corpo dos seus bebés.

A transferência dos partos de casa para o hospital fez com que este cenário passasse a ser vivido apenas por uma pequena percentagem de mulheres. Para a grande maioria das mulheres o parto é visto como algo a suportar para “merecer” o prémio final que é ter um filho.

A sociedade tratou de afastar as mulheres da sua sabedoria interior. Os cenários de partos em intimidade, privacidade foram substituídos por salas estéreis e frias, por vozes de comando sobre o que a mulher deve ou não pode fazer durante o seu trabalho de parto e parto e o emprego de forma rotineira de práticas e procedimentos que não estão suportados por evidências científicas e que, salvo raríssimas excepções, não trazem mais-valias para ela ou para o seu bebé. Estas práticas e procedimentos incluem a tricotomia (raspagem dos pêlos públicos), o clister ou enema, a perfusão endovenosa, o jejum, a rotura precoce de membranas, a aceleração do trabalho de parto, a monitorização electrónica contínua, a episiotomia, o trabalho de parto e o parto em posições supina (deitada de costas), etc... O suporte emocional passou a ser quase inexistente com a transferência dos partos de casa para os hospitais.

Na década de 1970, John Kennell e Marshall Klauss realizaram um estudo em que provaram, através de seis experiências clínicas controladas, que a presença de uma pessoa de apoio ao parto, do sexo feminino, encurta o tempo do primeiro parto numa média de duas horas, diminui a hipótese de cesariana em 50 por cento, parto com fórceps em 40 por cento, diminui a necessidade de medicação para as dores e anestesia epidural em 60 por cento, ajuda o pai a participar com confiança e aumenta o sucesso na amamentação. [1] [3] [4]

Para designar as mulheres que sem aptidão profissional prestavam apoio no parto, no estudo efectuado por John Kennell e Marshall Klauss foi usado o termo doula.

A doula sobrepõe-se à frieza do ambiente hospitalar dando apoio emocional na gravidez, parto e pós-parto, escutando as dúvidas, anseios e medos da mulher e do seu companheiro durante o período maravilhoso que é a gestação, o parto e o pós-parto, não os deixando sem resposta, contribuindo para o reforço da confiança da grávida no seu próprio corpo, na sua capacidade inata de parir e amamentar o seu filho, tentando reaproximar a mulher da sua sabedoria interior.

Uma doula é alguém que, com ou sem experiência da maternidade, tem uma grande capacidade de amar o próximo (é principalmente de amor, segurança e confiança que a mulher que está para dar à luz precisa), está consciente da sua sabedoria interior, conhece o poder do corpo feminino, acredita na capacidade inata das mulheres parirem e tem vocação para apoiar outras mulheres nesta maravilhosa etapa que transformará para sempre as suas vidas.

A doula acima de tudo tem que saber escutar as necessidades da mulher grávida, procurando saber o que ela pretende com a sua gravidez e as suas expectativas em relação ao parto. Uma doula é uma amiga, alguém que independente das suas convicções presta apoio e aconselhamento sem nunca dizer não deves ou não podes mas oferecendo a máxima informação possível para que a grávida/casal possa tomar as suas próprias decisões de uma forma consciente e informada.

A doula é alguém que sabe o que a mulher que está a parir quer ou precisa sem recurso a palavras. Ela tem um profundo conhecimento da mulher que acompanha, conhecimento este que vai adquirindo ao longo dos encontros que tem com ela e/ou com o seu companheiro durante a gravidez. A doula é uma mulher discreta no cenário do parto, é uma mulher que não interfere no processo de nascimento, não observa, está ali como uma mãe que presta apoio a um filho, está ali para satisfazer as necessidades básicas da mulher em trabalho de parto. A Doula não faz qualquer tipo de acto médico e portanto não substitui qualquer dos profissionais envolvidos na assistência ao parto.

A doula entra no espaço de uma parturiente, reage prontamente e está consciente das suas necessidades, disposição alterações e sentimentos calados. Não necessita de controlar nem abafar. Todas as grávidas deviam ter os benefícios de uma doula. A doula não prejudica o papel do pai do bebé. Realça-o e liberta-o para se dedicar à tarefa tão importante de amar a mãe. [3]

Tal como o Dr. John Kennel disse um dia, se um medicamento tivesse o mesmo efeito de uma doula seria contra a ética não o utilizar. [3]

[1] Apontamentos da Formação de Doulas
[2] Jones,R.(2004), Memórias do Homem de Vidro - Reminiscências de um Obstetra Humanista
[3] Northrup, C.(2000), Corpo de Mulher Sabedoria de Mulher
[4] Odent, M.(2005), A Cesariana, Operação de Salvamento ou Indústria do Nascimento?
[5] http://www.doulasdeportugal.org/
[6] http://www.doulas.com.br/
[7] http://www.dona.org/
[8] www.doulas.info/publi.php
[9] http://www.paramanadoula.com/doula.php